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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Antes de ler um livro, podemos escrever o nosso.

Segundo Nietzsche, o homem nasce preso à cultura, tradição, costumes, e regras morais que condicionam o indivíduo a fazer sempre ações que satisfaçam o interesse da coletividade – o que implica que se considere a coletividade mais importante que o indivíduo. Ser moral, de bons costumes, ético significa ser obediente a uma lei ou tradição instituída há muito tempo.
Quando a moral promove um indivíduo de caráter forte, que não lhe deixa andar fora do caminho prescrito pelos seus valores, que obedece a todo “tu deves” que a moral ensina, que obedece à tradição e sabe que a sabedoria vem dela, que despreza o novo por não saber aonde ele pode nos levar, ela cria um espírito subordinado. O espírito subordinado não toma suas atitudes por razões, mas por hábito.
O espírito livre é aquele que “chegou a ser livre”, que voltou a tomar posse de si próprio. De repente, sem uma justificativa plausível, ele começa a lançar uma dúvida sobre todos os valores que obedece sem saber porque, o que o leva a suspeitar de tudo o que antes parecia certo e começa a viver então o outro lado. Ele possui uma grande vontade de testar os valores, saber o que acontece se inverte-los, quer testar novas possibilidades. Não importa que tenha uma visão mais acertada das coisas, o que é preciso é que se desligue de tudo que é tradicional, não importa se com êxito ou com malogro. É preciso que sua experiência abra caminhos que os costumes impedem que os homens trilhem.
A missão do espírito livre é promover uma metamorfose da existência humana, a vida já não tem significado antecipadamente dado, já não é conduzida pela vontade de Deus, nem pelas prescrições da moral, ou por um ultramundo metafísico – tornou-se livre. O homem aprende que viver significa ousar, e a vida torna-se possível como experiência.
A desconfiança do espírito livre significa uma negação que prepara caminho para uma afirmação. O homem deve colocar objetivo a si mesmo; deve tornar-se senhor de si mesmo. Sua experiência é seu guia, estar vivo significa ousar viver, ter o poder de colocar objetivo na sua existência e viver de acordo com a sua meta. Descobre-se a si próprio como criador de valores e adquire com essa descoberta a possibilidade de criar novos valores.
Depois da grande desconfiança e do desmonte de todos os ideais, é preciso hierarquizar os valores que agora sim escolherá seguir. Tornar-se senhor de si mesmo implica hierarquizar valores, descobrir seu bem e seu mal; deve adquirir domínio sobre seu pró e seu contra e aprender, a saber desengata-los e engata-los de novo, conforme seu designo superior.
Raul Seixas, roqueiro baiano, nascido em 1945 (o ano da bomba atômica), começa sua caminhada em direção a si mesmo utilizando a via do rock.
Se o rock foi para Raul o veículo para a grande separação dos valores tradicionais, sua vida foi também um exercício de tornar-se senhor de si próprio. As letras de suas músicas falam sobre fazer aquilo que se tem vontade, críticas a vida mediana dos espíritos subordinados, o valor do seu próprio caminho.
Como espírito livre Raul é egoísta, individualista, sabe-se medida de todas as coisas, e que não nasceu para passar pela vida, mas sim para deixar sua impressão digital marcada no planeta, fazendo sua pequena participação de passagem por esse lugar. Uma passagem no sentido de fazer uma reestruturação de todos os valores. E criar valores para Raul é agir pela sua vontade. “Faze o que tu queres, pois é tudo da lei”. Mas também lembra que “a lei do forte, essa é a nossa lei e a alegria do mundo”. Por que somente o forte pode fazer o que quer e arcar com as conseqüências. Quem é forte pode criar seus valores e quem não é pode continuar subordinado às leis que não criou.

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